Há 10 anos, eu descobria (e vivia) o poder viral da internet
Uma despretensiosa foto postada nas redes sociais mobilizou diversas pessoas em torno de uma causa
De repente, as notificações de compartilhamento não paravam. Não demorou muito, jornalistas começaram a me mandar mensagem, pedindo meu telefone para entrevista. Horas depois, a foto que fiz – juntamente com uma breve fala, estavam nos veículos locais. E não demorou muito, a notícia estava na capa do Globo.com. Em 5 de novembro de 2012, o Facebook ainda era uma novidade pra mim. E, toda aquela repercussão, mais ainda.
Semanas antes, um ciclista tinha sido atropelado em uma das principais avenidas de Florianópolis e faleceu. Seus amigos então pintaram uma bicicleta toda de branco e a penduraram próximo ao local do incidente. Acompanhando o noticiário, descobri que aquilo era uma homenagem e tinha um nome: Ghost Bike (bike fantasma).
Acontece que , misteriosamente, dias depois, a bicicleta desapareceu do local da homenagem. Para a comunidade de ciclistas da cidade, aquilo era como profanar um túmulo. E, engajados, o fato também virou notícia, dando continuidade à história da morte do esportista.
Creio que foi por isso tudo que me chamou atenção quando eu estava indo de carro para o trabalho e vi uma moça com uma bicicleta toda branca. Não era possível, só podia ser a bicicleta fantasma que desapareceu! Naquela hora, minha “veia” jornalística pulsou mais forte. Eu tinha que denunciar aquilo!!! Mas, uma coisa que aprendi bem na faculdade de jornalismo é que não é papel da imprensa julgar – e todo mundo deve ser tratado apenas como suspeito, ficando para a justiça / polícia atribuir culpa. Por isso, resolvi fotografar sim, mas sem mostrar o rosto da ciclista.
Mas, o que ia fazer com a foto? Em 2012, a participação da população na pauta jornalística ainda não era tão comum. Então, resolvi postar em meu feed do Facebook e também mandar para uma página que falava para a cidade. Ações despretensiosas, quase que por desencargo de consciência. Isso porque eu ainda não conhecia o poder que as redes sociais tinham criado, capazes inclusive de pautar a própria imprensa.
“Avistei hoje na Lagoa uma pessoa que aparentava estar usando a bike fantasma furtada ontem (4) no Santa Mônica. Para quem não sabe, a bike é uma memória ao ciclista atropelado este ano na Avenida Madre Benvenuta”
Meus amigos compartilharam, a página para a qual eu tinha enviado o link da minha publicação com a foto também. E diversos de seus seguidores fizeram o mesmo. Por sua vez, os amigos dos seguidores. Tantos compartilhamentos que chegou a alguns colegas jornalistas, que entravam em contato querendo saber mais informações e pedido para publicar a foto.
A repercussão foi tanta na cidade que a própria pessoa que estava com a bicicleta resolveu devolvê-la à polícia. Ao delegado, alegou que não sabia que a bicicleta tinha dono e por isso a pegou de onde estava pendurada. Com o memorial perto de ser reestabelecido, recebi uma mensagem da filha do ciclista morto, agradecendo.
“Olá, Diogo! Sou Melissa, filha de Jose Lentz Neto, da bicicleta fantasma. Quero te agradecer a coragem e parabenizar pelo profissionalismo, pelo compromisso com a verdade dos fatos. Acho que se não fosse a tua foto e a tua atitude a bicicleta continuaria “perdida”. Obrigada!”
Dez anos depois, histórias que começam na internet e se espalham, chegando à imprensa, surgem diariamente. Porém, naquela época, passei dias pensando em que coisa incrível o poder das redes sociais. Só não imaginava que um dia alguém iria usar esse poder para espalhar notícias falsas…
Para quem ficou curioso , seguem alguns links das notícias publicadas na época:
G1 / Globo.com –Após ser fotografada pedalando, mulher devolve ‘bicicleta fantasma’
ND Mais (Grupo RIC/Record) – Bicicleta fantasma deve voltar à Madre Benvenuta na quarta-feira